29/01/2012

Censura, ¿por qué no te callas?


Bem, pessoal. Postagem nova para discutir algo já bem conhecido. Sim, os ânimos têm se mostrado bastante sensíveis nos últimos tempos, sendo cada vez mais comuns formas de censura. Discutamo-nas agora, em especial, no campo das artes. 
Recentemente meu amigo, o escritor Roberto Denser, passou por um imbróglio devido a um conto que enviara para publicação. A recusa  do texto veio acompanhada de justificativas que, no, mínimo, nos fazem pensar um pouquinho, tais como “por conter linguagem inapropriada e apologia ao uso de entorpecentes”, ou pelo conto não ser "familiar".
É bastante comum de minha parte encontrar em regulamentos de antologias, por exemplo, certas expressões que são bastante duvidosas e parecidas com as justificativas acima descritas. Ou seja, o antologista deixa claro que não aceitará textos que "firam a moral e os bons costumes" (seja lá o que isso for), ou que tematizem assuntos extremamente polêmicos. 
Não raro ouço alguns dos prórpios antologistas/ editores serem também vítimas desse tipo de discurso. Um exemplo ocorrido no ano passado mostra que a Editora Estronho sofreu críticas ferrenhas por causa do título de uma antologia Steampunk escrita por mulheres (a saber, a coletânea se chama Steampink, já comentada aqui), sendo taxada de sexista e coisas do tipo. 
E onde quero chegar tendo citado esse pessoal todo? Parece simples, mas não é.
Ora, toda preocupação existente no sentido de combater eventuais problemas éticos ou que firam a integridade de cada um é válida, fato inegável. Entretanto, há uma tendência nos últimos tempos de fazer com que essa preocupação se amplie a níveis exorbitantes, o que faz com que coisas com as quais não estejamos tão habituados soem como ameaça em potencial, sendo então evitadas ao máximo. Com a velocidade que estas opiniões são propagadas, as pessoas desinformadas tendem a incorporar o pensamento generalizador, o que acaba fazendo com que todos fiquem com medo de se expressar. Para arte, essa generalização traz problemas gravíssimos. Um deles já tem se refletido há um bom tempo: há um medo enorme por parte do artista de ousar (neste caso mais no aspecto temático). O escritor teme ser linchado na rua por construir um personagem machista, teme virar motivo de desprezo pelas redes por ter escrito um conto em que um personagem/ narrador se posicione nazista, teme que os amigos de igreja o excomunguem por ter criado um discurso defendendo o ateísmo em uma de suas narrativas. Os artistas passam a ser vistos mais  como bruxos/ hereges do que como o que são; os acusadores, imbuídos do espírito do politicamente correto, mais se apresentam como inquisidores que pouco olham seus próprios problemas. Por outro lado, o comportamento dessas pessoas acaba se impondo e criando novas "normas para publicação". O resultado são textos, digamos assim, "inofensivos".  É evidente que um bom texto necessariamente não precisa ser de algum modo ofensivo, mas impreterivelmente ele necessitará de tensão, bem como representar as tensões do universo em que se encontra; ignorar essas tensões só tende a criar textos pouco interessantes. A situação agradaria Platão, que pregava em sua República que poesia não é voz corrente e servia para "afeminar os soldados". Por outro lado, Aristóteles já nos mostrava que "o trágico é belo" e que a arte não é a realidade, tampouco imitação desta; apenas mera representação do que nela existe. Trocando em miúdos, um personagem racista não implica necessariamente um autor racista, nem tampouco cria leitores racistas; da mesma forma, personagens "de bem", não garantem que seu "autor/leitor" não seja um criminoso ou alguém de conduta duvidosa. A lição é simples, aprendida logo cedo, mas insistentemente ocultada num discurso que generaliza de forma covarde toda expressão artística. Não gosto de me citar, mas nesse caso é inevitável: trabalho com pesquisas sobre gênero, também com assistência social, mas isso nunca me impediu de criar um personagem misógino ou homofóbico. O bom senso passa cada vez mais longe nos últimos tempos, pois pensar cansa, e precisamos descansar frente a nossos programas de TV, pois nosso dia já foi muito cansativo. Fica então a pergunta: que faremos? Calemos diante de tudo e nos contetemos com uma arte cada vez mais água-com-açúcar?
Bom, o problema está exposto, rolam os dados. As ações, vejamos o que vocês me dizem. Abraço.

6 pitacos:

Excelente reflexão. Estou pensando seriamente em estudar censura no estado de direito (minha lista de tópicos para o possível TCC é enorme!), pois percebi que, por vezes camuflada com o bastião do 'melhor para a sociedade', a censura não apenas existe como persiste.

Defendo sempre: a arte não deve estar presa às rédeas do politicamente correto (meu ex-professor de dir. administrativo iria mais além e diria que nada deve), pois, sinceramente, quando isso acontece o que se passa por minha cabeça é que também ela é vítima de alienação.

Tenho mais comentários a fazer, mas todos demandam uma melhor organização dos fatos e argumentos, portanto ficará para outra oportunidade. Abraço.

Para mim isso é parte do "totaliritarismo difuso" d q Adorno falava. O sujeito é pressionado, mas, diferente dos anos 40, ele não tem um alvo exato a ser atacado, o pressão está diluída em todos q o cercam, dsificultando a sua percpção do problema. Pena eu nao ter citado adorno no texto, ficará pruma próxima tbm, até pq ele tem uma reflexão mto boa sobre a arte, em que diz q "por mais q a arte seja cruel, violente, etc, ela nunca se equiparará a crueldade do mundo real, pois ela sempre tem um viés positivo". ;)

bucetas `a parte (por alguns segundos apenas)

oh mundo fresco!

a arte naum deve se preocupar com nada
nem com o bem da humanidade
e se preocupa com tudo
inclusive com o bem da humanidade

e naum acho que essa frescura seja bom pra humanidade

pois é Jooedson, entender esse paradoxo não parece ser ao simples aos q estão preocuipados mais com a ordem. O resultado é essa generalização prévia d tudo q cria a danada da censura. :(

a única coisa no Brasil que deveria ser censurada é a corrupção. Como vemos, pra isso não há proibições. As editoras deveriam censurar textos ruins, não acham?

Esse tipo de coisa acontece quando o Estado começa a interferir em coisas que não lhe competem (para isso, sairá dia 22 um texto-monstro no Calango) e quando o povo se deixa alienar ao ponto de até mesmo os pretensos intelectuais de uma sociedade apelarem para o politicamente correto (lembra do meu texto sobre o Buraco-Negro)?

O problema é que acabamos por interferir no fluxo natural das coisas, criamos uma "barragem", e quando a água se acumula demais, ela explode (ou acham que essas músicas toscas de ultimamente são o "livre expressar do povo"? Aquilo é um sentimento há muito reprimido que explodiu de repente, sufocando, entre outras coisas, a qualidade artística!).

Só espero que a válvula de escape dessa geração não seja um segundo estado nazista.

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